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Tradição gastronômica no coração de Ginza


Mais que pratos, a cozinha kaiseki é uma filosofia culinária. Sua origem está nos mosteiros budistas onde os monges costumam manter uma rotina frugal de alimentação. A palavra kaiseki é escrita em japonês com dois caracteres (懐石) e, em seu sentido literal, se refere à pedra quente que os monges colocavam na parte frontal de suas vestimentas para aplacar a fome durante os longos períodos de meditação.

O kaiseki tradicional é servido em pequenos pratos, numa espécie de banquete. A ideia é usar ingredientes locais e sazonais para servir uma comida balanceada em termos de sabor, textura, apresentação e cores. Por isso, os pratos de um banquete kaiseki podem ser apreciados não somente com o paladar mas também como pequenas obras de arte.

O Ginza Hyakuraku é um dos restaurantes de Tóquio que servem o kaiseki. Aqui, a maior parte dos ingredientes vem de Tokushima, uma das quatro províncias da ilha de Shikoku. Tokushima é considerada a ‘arca dos tesouros gastronômicos’ da ilha.

Chegamos ao restaurante e fomos encaminhados a um espaço privado em forma de balcão, onde é possível ver o chefe fazendo os últimos preparos e a montagem dos pratos que serão servidos ao longo do banquete. Escolhemos o mini-course de almoço com 5 pratos e uma sobremesa (¥5000/pessoa).

O serviço começa com uma dose de bebida alcóolica, que serve para o brinde de abertura do banquete. No Hyakuraku é servido o sudachi-shu, um licor feito com saquê refinado e suco de sudachi, um cítrico que é parecido com o limão e a fruta símbolo da província de Tokushima. A fruta em si tem sabor bem azedo mas o licor é relativamente doce.

Em poucos minutos chega à mesa o zensai, ou seja, aperitivo. Trata-se de uma entradinha com peixe cozido no vapor, pedacinhos de polvo e alga wakame. Da louça à montagem, tudo é colorido, com pétalas de flores na decoração. Eu, particularmente, não gosto de polvo mas não pude deixar de provar e a textura, que é o que mais me incomoda no molusco, estava divina. O polvo macio acompanhado do avinagrado do molho e o doce da alga wakame fizeram da entrada um deslumbre.

Em seguida, entra o wanmori. que é um algum cozido com um caldo bem claro e leve. No nosso banquete foi servido o caldo com o shinjo, uma espécie de bolinho feito com massa de peixe e, neste caso, cozido no vapor. O resultado é um bolinho macio e fofo, com sabor delicado e que casa muito bem com o caldo leve que o acompanha.

O próximo prato é um yakimono, ou seja, um grelhado. O lírio (kanpachi, em japonês) é um peixe muito apreciado pelos japoneses. É comumente usado em sushis e, para nós, apareceu levemente grelhado e acompanhado do edamame (grão de soja ainda na vagem), minimilho, nabo e cogumelo shimeji. O molho levemente ácido deu o tom do prato. Um detalhe que chama a atenção neste prato é uma bela folha decorativa, produzida por uma cooperativa de senhoras da província de Tokushima.

O banquete segue com um nimono, ou seja, um cozido. Desta vez, de frango com abóbora e quiabo. Honestamente, de todos os pratos, foi o menos saboroso. Uma pena já que o prato estava muito bonito.

O prato seguinte é chamado de tomewan. A palavra é escrita em japonês com os caracteres para ‘parada’ e ‘tigela’. Ou seja, trata-se do último prato salgado do banquete. A nós foi servido um ochazuke que é um prato com arroz servido em um caldo feito com chá verde e o tradicional dashi (rico em umami, o sabor essencial da culinária japonesa). O prato é bem comum, caseiro mesmo, e até me surpreendeu surgir num banquete de kaiseki. Estava delicado, com pouquíssimo sabor, na verdade. Mas, para alguém que já estava se sentindo acarinhado pelos pratos tão singelos e deliciosos, ter o ochazuke como tomewan foi uma bela surpresa. Acompanhando o ochazuke, o koumono, ou seja, um picles.

Para encerrar, como sobremesa, veio um delicioso sorvete de leite acompanhado do fugashi, um biscoitinho feito com seitan, um subproduto da farinha de trigo, rico em glúten. Grãos tostados de trigo sarraceno salpicados dão um toque especial à sobremesa.

Para quem está acostumado com a fartura dos banquetes de família, pode ser que o kaiseki seja muito pouca comida. Particularmente, me considero um bom garfo. Sou de família nordestina e comida na mesa sempre foi em grande quantidade. Acontece que é possível se satisfazer com um banquete kaiseki e suas pequenas porções servidas sem pressa. No fundo, comer com calma, admirando os detalhes visuais e gustativos do prato também tem efeito saciador. E, mais ainda, o kaiseki é uma experiência prática para quem quer compreender o modo tradicional japonês de ver a vida. Aqui, o clichê se aplica com toda a força: menos é mais.

1:15 | Hyakuraku Ginza: Tradição na culinária kaiseki

 

Serviço

Ginza Hyakuraku

Tōkyō-to Chūō-ku Ginza 6-7-18 [mapa]

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